segunda-feira, 7 de novembro de 2011

A Morte!

A morte... O meu querido poeta, Mario Quintana, tinha o dom de brincar com as palavras. Fazia graça e poesia e, claro, falava sobre a morte. Dizia: "A morte não melhora ninguém". Ou: "Quando morremos acontece com as nossas esperanças o mesmo que com esse brinquedo de estátuas, em que todos se imobilizam de súbito, cada qual na posição do momento. Mas as esperanças têm menos paciência. E vão imediatamente continuar, no coração de outros, o seu velho sonho interrompido"... Ou ainda, descobri em seus escritos: "No dia em que estiveres muito cheio de incomodações, imagina que morreste anteontem... Confessa: tudo aquilo teria tanta importância?"
Pois tantos poetas, escritores, filósofos, psiquiatras e outros entendidos passam escrevendo e pensando a morte. Tentando dar conta do que ela representa. Irving Yalom coloca em todos seus livros, a morte como o centro de tudo que rege as nossas vidas. Nos preocupamos demasiadamente com a única certeza que se apresenta para cada um de nós, desde o nosso nascimento. Aprendemos desde pequenos a perder coisas, perder afetos, perder pessoas e perder as próprias coisas que nos compõem. Os sonhos, a esperança... Mas não lidamos bem com a morte. Há quem acredite que a morte não é um fim. Outros tem outras crenças. Mas, por aqui, na nossa sociedade, a morte vem acompanhada de rituais profundamente tristes. Colocamos, na maioria das vezes, uma pessoa em uma caixa e a enterramos. Fim.
Estou lendo "Limite Branco" de Caio Fernando Abreu e, em um determinado momento, a morte aparece. Maurício, personagem do livro, demonstra toda sua dor pela perda. Enquanto uma moça estava deitada em um caixão, coberta de flores, e as pessoas choravam alto, em volta, ele encolhido em uma poltrona, coberto e protegido do frio, pensa: Quem me alimentará? Cuidará dos meus ferimentos e dores? Quem me servirá o leite quente ou me contará histórias? E, de repente, o livro esclareceu para mim uma coisa que até então não havia percebido: a morte é um desaforo. Um desaforo para quem fica. Afinal, neste mundo tão cheio de "eus", dores e preocupações pessoais, como alguém pode ousar morrer? E como "eu" fico? É uma ofensa pessoal. E, na maioria da vezes lidamos como uma coisa pessoal. "Eu" perdi.
Enquanto velamos um amigo, um parente ou um amor, a pergunta recorrente é: E agora? Como vai ser daqui para frente sem esta pessoa? E eu? Será que sei viver a minha vida? Será que estou cuidando da minha saúde? Será que estou rodeada de quem me ama? Eu? Eu! E o medo da morte se apresentou para mim, como a coisa mais egocêntrica possível. O outro se foi e eu sigo me preocupando em como ficarei? E o outro? A vida do outro? Choramos a morte e não celebramos a vida. Quem morreu e uniu um tanto de gente em volta, viveu. E a vida como foi? E o que é a morte afinal?
As coisas permanecem inabaláveis. As ruas seguem iguais. Tem os mesmos nomes. O clima não muda com a partida das pessoas. Os carros seguem seu caminho. As crianças seguem brincando. E os pássaros cantam, as pessoas riem, trabalham, amam, se apaixonam, se decepcionam... Então lembrei, neste sábado, depois de enterrar um amigo querido do tempo de adolescência. (Sabe aquelas pessoas que fazem parte intensamente da vida da gente em uma determinada época? Depois a gente vai perdendo estas pessoas pela vida e, com sorte, algumas conseguimos reencontrar). Pois bem, este amigo que perdi era uma destas pessoas que fazem parte da gente, em um determinado momento. Morto. Acabado. Enterrado. Será? Este amigo, em especial, era super espiritualizado, tinha suas crenças... E teve na sua despedida uma porção de pessoas consternadas, emocionadas, dando adeus. E uma energia especial reuniu uma porção de pessoas afastadas pelo tempo e afazeres. Redescobrimos, através dele, uma montanha de afeto e lembranças, soterradas pela nossa falta de tempo, de disponibilidade para o que realmente importa. Lembrei que a vida só vale a pena ser vivida quando compartilhada com amigos. Esta é uma crença. A minha crença. Compartilhar os momentos de alegria, sucesso, dor, tristeza, descoberta e todas as coisinhas que nos fazem sair da cama, só vale quando está previamente aquecido pelo afeto, atenção e amor dos amigos. E, em amigos incluo pai, mãe, irmãos, filhos, sobrinhos e os que escolhemos. Os amigos eleitos. Lembrei que a morte do significado da vida é possivelmente a morte real.
Já li sobre a morte, me preocupei com ela. Já perdi pessoas especiais e importantes. Sinto saudade. Senti a dor e o vazio da perda. E, acredito, que aprendi com cada uma destas pessoas em vida e com suas mortes. A morte nos traz ensinamentos. Nos faz refletir. E coloco aqui, para vocês que estão lendo estas palavras, um ensinamento Budista, que acredito e compartilho: Não nascemos, nem morremos, apenas continuamos.

5 comentários:

  1. lindo post! Definitivamente o simples ato de viver é a mais eficaz resposta ao medo da morte...pessoalmente diria que a filosofia é essencialmente uma busca ou luta contra a perenidade da existência que nos abala todas as certezas da vontade... Mas acho que somos para morte na exata medida que existimos afirmando a vida. Quanto maior minha certeza de morte mais quero tentar ir ao fundo de existir, me construir como eco e lembrança...

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  2. todas as pessoas que nos são importantes vivem em nossa existência... São parte de nossa existência. De certo modo , como individuos e biologia somos a soma de muitos rostos. Nós os perpetuamos existindo... Este me é um assunto caro e dramático...

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  3. ps. caso me autorize, gostaria de compartilhar este post no face

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  4. Belíssimo texto Coca!

    "Essa é das minhas" como diria o Rick, meu pai.

    Bj! Paz e Luz!

    Fábio

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  5. Depois de escrever, a alegria maior é ler o que vocês acham do texto. Saber se, quem leu, gostou ou não. Receber estas mensagens alegram a minha alma de uma maneira indescritível. Muito obrigada! Beijos a todos vocês.

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